7.1.11

vida vs morte e tudo o que está pelo meio

Não tenhas medo do passado. Se as pessoas te disserem que ele é irrevogável, não acredites nelas. O passado, o presente e o futuro não são mais do que um momento na perspectiva de Deus, a perspectiva na qual deveríamos tentar viver. O tempo e o espaço, a sucessão e a extensão, são meras condições acidentais do pensamento. A imaginação pode transcendê-las, e mais, numa esfera livre de existências ideais. Também as coisas são na sua essência aquilo em que decidimos torná-las. Uma coisa é segundo o modo como olhamos para ela.

Oscar Wilde, in 'De Profundis'
 




começamos a nossa vida no momento em que nascemos, e tudo à nossa volta muda pois assim os nossos olhos compreendem o mundo em que vivemos. as coisas valem o que valem. os problemas dos outros, os nossos próprios, o nosso egoísmo, o nosso altruísmo, tudo é produto da nossa forma de olhar, de estar, de tudo o que vivemos até então. qualquer um pode dizer que "entende". às vezes não entende nada, e sabemos. quem vive um qualquer drama, por pequeno que seja, sabe dentro de si se o outro "entende" ou não. na maioria das vezes, não entende. é algo de indefinível, mas que está lá. sentimos. pode aproximar ou pode afastar amigos, irmãos, amantes. pessoas. às vezes não tem nada a ver com a experiência que a pessoa teve e por isso, entende. tem mais a ver com sensibilidade. entendemos tudo de forma diferente. as coisas que me afectam, a acontecer ao próximo, podem não afectá-lo da mesma forma. a morte, por exemplo. quem nunca passou pela perda não entende de todo. é a pior dor que existe. a pior de todas. não se entende até que se tenha perdido alguém. um avô, uma mãe, um amigo. quem nunca passou por isto não entende e não tem o direito de dizer que entende. é algo que não se explica nem se percebe. é algo que se vive.

da mesma forma, uma doença que nos acontece.
viver a doença de alguém é estar do lado de fora, por mais que se sofra.
se nos dizem que estamos doentes é como um acidente. é como sentir que estamos a cair de um plano muito mais alto. sem rede, sem saber se vamos conseguir sobreviver a isso. é ter o mundo de cabeça para baixo, é não voltar a ver o mundo da mesma maneira. tudo mudou para mim nos últimos dois meses e não consigo ainda explicar como me sinto. não consigo perceber o que sinto. não consigo perceber se quero mudar a minha forma de ver as coisas, se manter a cabeça fria e continuar a dizer que sim, que vale a pena viver. é não conseguir perceber o dia de amanhã.

sinto que grande parte de mim morreu no dia em que deixei de poder falar com a minha mãe. não volto àquele lugar de conforto que tinha ao conversar com ela, pois era das poucas pessoas que me entendia, apesar de ser minha mãe, pois nunca somos quem somos de verdade ao pé dos nossos pais. ela era diferente, era uma pessoa diferente, e fui perdendo tudo o que éramos aos poucos. a psicóloga perguntou-me como é que consegui arranjar forças. "tanto quanto é possível sabê-lo quando se tem 12 anos de idade e percebemos que tudo é efémero aos 12 anos de idade" respondi. que pergunta tão estúpida, tão cliché, tão de série girly tipo anatomia de grey. onde é que fui arranjar forças... foda-se. "o que é suposto responder a isso?" perguntei-lhe de volta, para que ela pudesse perceber que não, não é pergunta que se faça,como aquelas perguntas estúpidas que se fazem às crianças, tratando-as como se fossem anormais. 

ninguém sabe onde vai arranjar força para enfrentar seja lá o que for. eu sei que parte da minha força era a força que a minha mãe tinha. uma troca. e agora não a tenho. 

e agora isto. um nódulo no rim. herança pesada, mãe, problemas nos rins. é irónico, fodido e não sei onde ir arranjar forças. perguntei à psicóloga. respondeu-me que é mais um "obstáculo", um "desafio". pois. não é a ela que aconteceu, que provavelmente vai ter de tirar um rim. é tão mais fácil quando são os outros. não consigo deixar de pensar que é tão mais fácil quando acontece aos outros e que todos não passamos de meros fantoches cheios de boas intenções e sentimentos relativamente aos problemas dos outros, mas não entendemos nada até que algo semelhante nos aconteça. às vezes basta ser sensível, mas nada como termos passado pelo mesmo.






5 comentários:

Nuno Guronsan disse...

Não sei que te diga. Apenas posso ter esperança que, como tanta coisa na vida, também isso passe e que continues a ter alegria de viver. Para tudo o resto, bom, estou aqui caso queiras desabafar, minha querida.

Um beijo grande e um abraço muito apertado de quem não pode estar aí, do teu lado.

A.na disse...

Escrever é uma forma de desabafar Nuno. De abrir, de aliviar o peso disto, de que não falei com quase ninguém, para não dizer apenas... 6 pessoas, para além dos médicos.

Quando coisas deste género nos acontecem, os outros começam a tratar-nos de forma diferente, e isso eu não quero.

Basta dizer que as outras 6 almas são pessoas que carregam elas próprias os seus fardos e ninguém melhor do que almas destas para nos ajudar nos piores momentos... enfim...

Mas claro que continuarei a ter a minha energia tão particular, e a viver ao máximo tudo o que tiver de ser vivido. De que adianta viver se não for assim, intensamente?

Obrigada pelas tuas palavras Nuno e desculpa qualquer coisa... isto dos Blogs é mais pessoal do que por vezes parece não é? :)

Beijo

Bluesy disse...

Não posso oferecer mais para além do meu tempo e dos meus olhos para te ler.
Um beijinho.

La Tempesta disse...

Vou usar uma frase que tu bem conheces:
You are my person!

A.na disse...

Sou nada! Abandonaste-me! Fugiste pó Brasil! Ou será Brásiu?

fdx hoje acordei mesmo virada do avesso. hoje é daqueles dias...