17.8.11

ter esperança (dez anos depois)

Há dez anos atrás prometi a mim mesma que me havia de recordar de tudo o que estava a viver naquela altura, agora. Dez anos depois. Confiante de que seria muito melhor, acontecesse o que acontecesse.
2001, o annus horribilis da minha vida.



Precisamente há dez anos atrás, em agosto de 2001, vivia o princípio do fim de muita coisa, o início de uma nova etapa da minha vida. Dizem que de sete em sete anos as pessoas vivem fases. No meu caso, e como pretendo viver até aos 100, a coisa dá-se de dez em dez. E não é de coisas feias mascaradas de belas que me refiro, que ficam bem em blogs para mostrar aos amigos virtuais, nem tampouco de momentos efémeros ou de amores perdidos, que se vivem na casa dos vinte. Esses, cabem noutro tipo de post, noutro contexto que não este. Este, é o post da memória e da vitória amarga, dez anos depois. As promessas que fazemos a nós mesmos são estranhas, principalmente no momento em que tudo questionamos, até à própria vida, e a única coisa que nos resgata da loucura de cometer suicídio é apenas uma promessa, essa promessa.

Tinha acabado o curso, a minha mãe tinha tido um AVC (o primeiro de três) e morria numa cama de hospital, eu não tinha emprego, o meu namorado e eu não passávamos de estranhos, o meu avô viria a falecer alguns meses mais tarde, o tal namorado viria a acabar comigo uma semana depois, e a minha relação com a minha irmã ameaçava não voltar a ser tudo aquilo que tinha sido antes. A minha infância e a minha adolescência acabavam assim, era a chapada física e psicológica mais forte que alguém podia levar no espaço de um ano.

As coisas podiam ainda piorar? Podiam, podem sempre. Hoje sei que sim. Mas as coisas melhoraram. Até dado ponto, também pioraram, se for pensar bem. Não temos controle sobre tudo o que se passa, mas temos de acreditar que o nosso mundo, feito das mais pequeninas coisas, por mais que nos doam, não passam disso mesmo, pequeninas. O 11 de setembro aconteceu num dia particularmente feliz para mim, o dia em que a minha mãe saíu do hospital. Por incrível que pareça, a minha mãe viveu por mais dez anos e tenho de me sentir grata por isso, porque nunca pensei que tal fosse acontecer. Por pior que possa parecer, o 11 de setembro continua a lembrar-me a casa cheia, a felicidade de tê-la ali junto a mim, e as imagens que via na televisão da cozinha nada me diziam. No fundo, era apenas mais um atentado. Muita gente ficou chocada, mas àquela data, já morria muita gente na faixa de Gaza e em África, por guerras, fome e sede e falta de medicamentos e ninguém chorou essas vidas como choraram aquelas vidas. Como eu chorava e chorei a perda da minha mãe este ano, mesmo depois de ter tido mais dez anos que pensava já não poderem ser possíveis. De repente percebi o conceito de relativizar ou de perspectivar as coisas.

Essas "coisas" a que chamo a minha vida, melhoraram. Este ano fechou mais um ciclo, completou-se uma era. As relações com as pessoas já não são as mesmas. Algumas intensificaram-se, as circunstâncias e as vivências a isso propiciam, e a distância é sempre um factor de aproximação - ou não.

Daqui, de onde vejo o sol pôr-se no mar todos os dias, respiro fundo e espero ainda por melhores dias. A Ria deu lugar ao Oceano, e já não me sinto tão só como me sentia naquela altura. Penso que os meus melhores amigos não são as pessoas "de sucesso", com "carreiras brilhantes" iguais à força, ao talento e à determinação que possuem, em igual proporção ao seu esforço e mérito, não têm as férias de sonho em paraísos catalogados em brochuras de agências de viagens, e sei que sofrem por não terem um mínimo de paz de espírito, por diversas razões, mas sei que são puros. São puros de alma e coração, e por isso os amo profundamente. São iguais a si próprios, e apenas peço que se mantenham iguais a si próprios e que esperem por dias melhores, por horas felizes, tal como eu esperei.

Porque efectivamente as coisas a que chamamos Vida, melhoram.




7 comentários:

Spider Pig disse...

E melhores dias virão. Porque, tal como disseste, há fases melhores e piores, e depois de uma má vem sempre uma boa. E por aqui estaremos a aguardar por todas as fases. E tenho a certeza que os amigos também estarão sempre à distância de um telefonema. (Nem de propósito, começa a tocar o Dartacão!)

Nuno Guronsan disse...

Lindas palavras. A encherem de esperança o meu coração, ainda um pouco triste. Obrigado, minha querida professora, sempre a ensinar novas (velhas) coisas.

:)

Beijos.

Rebeubeu disse...

Este texto reflecte algum muito importante, no meio disto tudo. Todas as fases tem o seu lado positivo, esta, certamente entre outras coisas, hoje serviu para que escrevesses este texto, que já iluminou o meu dia.

inBluesY disse...

Interessante.
Parece, por vezes, que existem outras linhas, que nos unem.
Ontem, precisamente ontem, aproveitei os miudos não estarem e atirei-me de alma a dois gavetões onde guardei durante estes 10/11 anos, as coisas da minha mãe.
Recuperei memórias e outras tantas peças, que a minha memória apaga, ou fecha de forma a esquecer existências. Cartas. Fotos. Pequeno diário dela.

Levei 10/11 anos para conseguir pegar naquilo tudo, e dar-lhe um lugar melhor.

Começei por dizer "interessante", porque existem certas coisas tuas, que retenho, e ajudam muito esta minha fraca alma, em certos dias.
e ajudas imenso Amiga.

Thks

A.na disse...

Minha Amiga....

..ontem não atendi porque tinha uma torneira aberta àquela hora e.... é muito difícil por vezes... as horas difíceis ainda são muitas. As torneiras avariadas... é uma chatice...

A vida na ilha é mais fácil, é mais distante, mas não se pode fugir para sempre nem se consegue, aliás...

Acima de tudo, escrevo para mim, para me ajudar a lembrar de algumas coisas, certos estados de alma. isto não é literatura que se mostre a ninguém, mas enfim.... se já ajuda alguém, ou alguém se identifica com isto, óptimo :) já terei feito algo de bom com as minhas dores.

Tenho Saudades de te ler, older sister... lanço-te um desafio: onde estavas há dez anos atrás?

La Tempesta disse...

Lembro-me perfeitamente onde estava há 10 anos atrás e ainda que não me custe lembrar, não gosto de o fazer. Acho que já te disse imensas vezes que cada um vive o melhor que pode e sabe, acreditando que as coisas podem sempre melhorar ainda que tantas vezes a única coisa que a vida nos dê sejam chapadas atrás de chapadas. Não sou das que mais sofri, das que mais perdi, e posso dar-me feliz por ter na minha vida aquilo que é realmente importante. Pessoas que amo e que me amam também, pessoas como tu!

inBluesY disse...

tenho saudades de escrever
mas certas vezes é assim, anda tudo em correria dentro de mim, e nem sempre consigo parar...

gosto de desafios !